Filipe Cerqueira
Requiem de Giuseppe Verdi, 7 de Junho, Coliseu do Porto
Solistas: Cristiana Oliveira, soprano; Ana Ferro, Meio-soprano; José Manuel Araújo, tenor; Luis Rodrigues, barítono.
Começo pouco depois das 21:30, sala pouco preenchida. A disposição cénica inicial foi bem organizada. Com os primeiros acordes, dolorosos, os coralistas estavam à volta do palco, murmurando “Requiem” com articulação suficientemente audível. Aproximando-se, dirigiam-se com passos silenciosos para os estrados que ladeavam os solistas. Não necessitando de vislumbrar sequer a partitura nesta parte, demonstraram um verdadeiro conhecimento e respeito pelo carácter fúnebre da obra. Reflexo de vários meses de estudo que se expandiu ao resto do Requiem. Sinal dos tempos: a visualização de alguns já foi feita através de “tablet”. Por parte da orquestra, esta foi bem orientada por José Manuel Pinheiro, que dirigiu a Orquestra do Norte (de José Ferreira Lobo), tal como o coro Ensemble Vocal Pro Musica, que dirige desde que criou em 1991.
O Maestro demonstrou um perfeito domínio de toda a estrutura da obra, que tem uma orgânica um pouco diferente de conhecidos Requiem, como o de Mozart, Brahms ou Bomtempo (para quando o regresso do seu “à Memória de Camões”?). A orquestra respondeu muito bem ao seu estilo interpretativo, caracterizado pela constante necessidade de orientar o coro nos andamentos, clareza e equilíbrio entre os diversos naipes de instrumentos para uma união de matizes e timbres de forma a não encobrir os solistas e um grande cuidado em não revelar um romantismo próprio de Verdi numa obra de cariz sacro. O Coro este impecável: rigor rítmico, vigor em dinâmicas sem forçar o volume, garantindo liberdade aos solistas; excelente articulação e presença em palco. Algumas notas: No final do Confutatis emerge o tema Dies Irae, recorrente em todo o Requiem. Essa força motriz foi bem impulsionada pelo coro, que apresentou uma massa sonora forte, incisiva, impiedosa. A orquestra, neste momento, pareceu surpreender-se com esta reaparição do “Dia da Fúria” e não esteve ao nível do coro, num único momento de falta de entrosamento. Com o “Largo”, andamento da parte subsequente- Lacrymosa- a Orquestra dissipou todas as dúvidas e voltou a acompanhar convincentemente o coro e solistas. O Dies Irae, que reaparece no final do primeiro Libera Me, teria sido impiedoso, implacável e furioso se mais agitado, como inscrito na partitura (Edição Peters).
As solistas estiveram em muito bom plano. Vibrato sem exagero. A meio-soprano atacou sempre o início de frases no registo agudo de forma muito cristalina. Souberam mostrar o seu fulgor sem “berrar” por cima da orquestra e do coro. Usaram uma tiara e um colar extremamente reluzentes. Por parte dos solistas, o tenor apresentou uma voz muito esforçada, parecendo que a laringe subia demais, ataques pouco afinados, mas a tempo, voz muito apagada nos diálogos, desaparecendo nos tutti. Desta forma, não ajudou ao trabalho do barítono. O final revelou uma serenidade religiosa, eterna, que contagiou o público à reflexão, não havendo o aplauso imediato. Unicamente através de um sinal, o Maestro conseguiu manter um momento marcante de silêncio marcante, um ambiente próprio a um fim de missa para os defuntos.
Concerto: 4 estrelas.
Crónica de concerto publicada no semanário O Diabo Edição Nº 1903 – 18 de 06